Os adventistas do sétimo dia são acusados
de ensinar que Satanás também é um salvador, pelo fato de identificarem
o bode Azazel (ou emissário) com Satanás. O principal argumento
suscitado pelos acusadores é que Levítico 16:10 afirma que o bode Azazel
faz expiação: “Mas o bode sobre que cair a sorte para bode emissário
será apresentado vivo perante o Senhor, para fazer expiação por meio
dele e enviá-lo ao deserto como bode emissário.” Alguns
bem-intencionados apologistas tentam contornar o problema dizendo que o
bode Azazel não era um meio de expiação, mas, argumentando assim,
colocam-se numa posição vulnerável, pois o texto bíblico realmente
declara que o bode vivo faz expiação.
O verdadeiro problema na acusação
levantada pelos detratores do adventismo encontra-se no conceito da
palavra “expiação”. O senso comum evangélico induz a crer que expiação
signifique “perdão dos pecados”, o qual evidentemente só pode ser
proporcionado por Cristo. Mas, na verdade, o conceito de expiação é
outro.
Expiação tem sentido mais genérico e significa “pagamento dos
pecados” ou “remissão da culpa, pela aplicação da pena”. A Bíblia diz
que o salário do pecado é a morte (Rm 6:23) e que “quem morreu está
justificado do pecado” (Rm 6:7). A Bíblia diz também que pecado é a
transgressão da Lei (1Jo 3:4) e que a Lei suscita a ira (Rm 4:15),
referindo-se logicamente à ira de Deus (Rm 1:18). Assim, quando uma
criatura transgride a Lei, esta suscita a ira de Deus, a qual só pode
ser aplacada com o pagamento do salário do pecado, que é a morte. Esse
pagamento é a expiação.O pagamento do pecado não é feito apenas por Cristo. O pagamento do pecado deve ser feito primariamente pelo próprio transgressor. Quando Satanás, os anjos rebeldes e os ímpios forem destruídos no fim do milênio, eles não estarão fazendo nada mais do que a expiação pelos seus próprios pecados. Trata-se de uma expiação punitiva. Cristo, por Sua vez, faz expiação substitutiva, para dar aos seres humanos uma nova oportunidade de vida eterna, conquanto Lhe sejam fiéis. Logo, expiação não significa propriamente “perdão dos pecados”. Quando a intenção é referir-se ao que Cristo fez na cruz e está fazendo no Santuário Celestial, a fim de proporcionar o perdão dos pecados, deve-se dizer não apenas “expiação”, mas “expiação por Cristo”. Ou seja, a expiação só se refere ao “perdão dos pecados” se ela estiver qualificada com algum complemento (no caso, pelas palavras “por Cristo”).
A Bíblia utiliza a palavra expiação para outras situações que não a do perdão dos pecados. Observe-se: “Eis que um homem dos filhos de Israel veio e trouxe a seus irmãos uma midianita perante os olhos de Moisés e de toda a congregação dos filhos de Israel, enquanto eles choravam diante da tenda da congregação. … Vendo isso Finéias, filho de Eleazar, o filho de Arão, o sacerdote, levantou-se do meio da congregação, e, pegando uma lança, foi após o homem israelita até ao interior da tenda, e os atravessou, ao homem israelita e à mulher, a ambos pelo ventre; então, a praga cessou de sobre os filhos de Israel. … Então, disse o Senhor a Moisés: Finéias, filho de Eleazar, filho de Arão, o sacerdote, desviou a Minha ira de sobre os filhos de Israel, pois estava animado com o Meu zelo entre eles; de sorte que, no Meu zelo, não consumi os filhos de Israel. … E ele e a sua descendência depois dele terão a aliança do sacerdócio perpétuo; porquanto teve zelo pelo seu Deus e fez expiação pelos filhos de Israel” (Nm 25:6-8, 10, 11 e 13).
“Assim, não profanareis a terra em que
estais; porque o sangue profana a terra; nenhuma expiação se fará pela
terra por causa do sangue que nela for derramado, senão com o sangue
daquele que o derramou” (Nm 35:33).
Na primeira situação, os israelitas
tinham caído na estratégia de Balaão, tinham-se juntado a mulheres
midianitas e adorado a ídolos. Deus castigou o povo com uma praga.
Enquanto Moisés estava tomando medidas para castigar os pecadores, um
israelita trouxe uma mulher midianita para o arraial. Finéias ficou
indignado e matou a ambos. Deus elogiou a Finéias, dizendo que, por esse
ato, ele tinha feito expiação por Israel. Essa foi uma expiação
punitiva e não substitutiva. Não houve perdão de pecados.
Na segunda situação, Deus diz que o homicida deve ser morto para expiarcom seu próprio sangue o assassinato que cometeu. Trata-se também aqui de uma expiação punitiva e não substitutiva.
Esses conceitos são satisfatoriamente
explicados no livro do pastor Frank B. Holbrook, intitulado O Sacerdócio
Expiatório de Jesus Cristo (CPB). Holbrook é teólogo de grande
consideração na igreja adventista mundial e seus livros possuem amplo
prestígio. À página 143, ele declara: “Mas ‘expiação’ também pode ter um
sentido punitivo quando uma pessoa culpada e não perdoada perde a vida
como castigo por sua ofensa. … Assim como essas expiações punitivas do
assassino e do casal removeram a culpa da nação israelita, assim o bode
por Azazel (que levava as iniqüidades e a responsabilidade de Israel)
fazia expiação pelo recebimento do castigo, e não de maneira salvadora.”
A grande dificuldade que muitos têm de aceitar esse ponto é sua
compreensão parcial e equivocada do conceito de “expiar”. “Expiação” não
é sinônimo de “salvação” ou “perdão”. “Expiação” é o pagamento pelo
pecado. O texto já citado de Números 35:33 é prova inequívoca disso:
“Assim, não profanareis a terra em que estais; porque o sangue profanaa terra; nenhuma expiação se fará pela terra por causa do sangue que nela for derramado, senão com o sangue daquele que o derramou.”
Não é só o sangue de Cristo que faz
expiação. O sangue do assassino também o faz. Aliás, o verso enfatiza
que nenhuma outra expiação se fará pelo assassino a não ser com seu
próprio sangue. Por outro lado, é verdade que só o sangue de Cristo
proporciona perdão e salvação. Perdão e salvação são coisas diferentes
de expiação.
Disso tudo se extrai que o bode Azazel,
representando Satanás, realiza, sim, uma expiação, pois ele paga pelos
pecados que levou o povo de Deus a cometer. Deus acha justo punir
Satanás por ter induzido Seu povo a pecar. Satanás não pagará pelos
pecados do povo de Deus como um salvador, mas por ser culpado por ter
originado o mal: “Visto que Satanás é o originador do pecado, o
instigador direto de todos os pecados que ocasionaram a morte do Filho
de Deus, exige a justiça que Satanás sofra a punição final. A obra de
Cristo para a redenção dos homens e purificação do Universo da
contaminação do pecado encerrar-se-á pela remoção dos pecados do
santuário celestial e deposição dos mesmos sobre Satanás, que cumprirá a
pena final” (Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, p. 358).
(Henderson Hermes Leite Velten, advogado e membro da Igreja Adventista do Ibes, em Vila Velha, ES).
Fonte: Criacionista
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